Mulheres e a busca por posições de poder e liderança
Houve um tempo em que chegar ao topo da hierarquia da maioria das profissões era uma meta impossível para mulheres. O acesso a espaços de poder e de liderança era proibido na maior parte do mundo, e ainda o é em alguns lugares. Em teoria, já não é mais um objetivo inalcançável, no entanto, estamos longe de uma verdadeira igualdade de condições para chegar lá. A representatividade que vemos está longe do ideal, e os rostos que guiam a sociedade continuam, em maioria, os mesmos.
Constantemente escuta-se que nas salas de aula, as mulheres estão em pé de igualdade. Se não chegam até o topo é por falta de ambição, qualificação, habilidades técnicas e emocionais e por que priorizam outros aspectos da vida que não o profissional. A União Europeia, por via do European Institute of Gender Equality (EIGE), em sua busca pela igualdade de género, identificou dois problemas: a segregação vertical e a horizontal. A horizontal diz respeito à escolha dos cursos, e os estudos mostram que a escolha das mulheres tente para as áreas de humanidades e ciências sociais enquanto homens são maioria em engenharias, tecnologias e mecânicas. A segregação vertical, também chamada glass ceiling, corresponde às barreiras invisíveis que impedem as mulheres de chegarem às posições mais altas nas carreira, e consequentemente as impedem de terem mais poder e melhores salários. Os dois problemas estão intimamente ligados e contribuem para um ciclo vicioso de desigualdade. Nos cursos com menor adesão feminina, as barreiras são ainda mais fortes. Cria-se uma irmandade, que exige muito mais das mulheres que ali querem estar do que cobra dos homens.
Quanto mais perto do topo, maiores são as barreiras, e estas ficam cada vez mais subtis. O conceito do que seria um bom líder varia de acordo com a situação, a natureza da tarefa, a sociedade em que está inserido e diversos outros fatores, mas o que não muda é que a liderança está historicamente definida em termos masculinos (EAGLY, 2007). Inegavelmente há estereótipos de personalidade e escolhas de vida atreladas ao género que, juntamente com a qualificação técnica, contribuem para que um candidato seja visto como ideal. A ideia de que homens têm maior inteligência emocional e sangue frio ao lidar com as possíveis incubencias de um cargo alto enquanto mulheres agiriam com emoções ainda é amplamente difundida no mercado de trabalho. A desigualdade é estrutural e presente em cada decisão tomada na escolha de quem ocupa os cargos. Também nota-se a falta de diversidade nos próprios recrutadores, cargo em que deveria haver sempre um esforço para que não seja escolhido o mesmo perfil várias vezes. A caminhada até a liderança, para as mulheres e outras minorias, é solitária, só quem chega lá sozinha e se vê como uma peça sobrando sabe a diferença que faria ter lá um olhar semelhante ao seu.
Além da tendência a escolher homens, há que analisar também quem chega até o processo seletivo. Segundo o Informe de Percepção de Género feito a partir de dados coletados e divulgados pelo Linkedin acerca das candidaturas realizadas na plataforma, as mulheres se candidatam a 20% menos vagas e sentem que precisam atender a todos os requisitos da vaga antes de o fazer. O mesmo estudo diz que as mulheres têm 13% menos chance de sequer serem consideradas, os recrutadores abrem mais perfis masculinos quando estão em busca de alguém. A criação de mulheres para agradar e serem cuidadosas em suas ações e de homens como exploradores e independentes é um fator que explica esse tipo de comportamento na vida profissional. As mulheres se cobram mais e se valorizam menos; preferem não arriscar pois uma rejeição é a garantia de que não tinham o que era preciso.
A meta a ser alcançada não se resume à igual possibilidade de almejar e alcançar o poder, abrange também o acolhimento e a sensação de pertencimento ao chegar lá. Em um estudo da Universidade Dominicana da Califórnia, nos Estados Unidos, concluiu-se que a síndrome do impostor acomete cerca de 70% dos profissionais bem-sucedidos, principalmente mulheres. Essa síndrome faz com que a pessoa sinta que o seu sucesso vem do acaso, da sorte ou que só foi conseguido com a ajuda de outras pessoas, subestimando suas capacidades, inteligência e qualificação. O estudo aponta que ela é mais comum em mulheres que conseguem destaque em ambientes ou profissões tradicionalmente masculinas. Marta Vieira da Silva, Michelle Obama, Adele e muitas outras personalidades já vieram a público sobre terem sentido que não eram merecedoras de suas conquistas em algum momento de suas carreiras. É preciso combater ativamente os condicionamentos machistas que definem um teto para a ambição das mulheres e que podem acompanhar durante todo o percurso profissional.
Simone de Beauvoir (1908-1986) diz que é pelo trabalho que a mulher reduz a distância que a separa do homem. Mas não basta o livre acesso ao ensino superior e a possibilidade de trabalhar além da função doméstica, também não basta um trabalho forçado e movido pela necessidade, desigualdade e pobreza. A luta continua, em busca de oportunidades iguais para que mulheres cheguem até posições em que possam ser agentes de mudança
Gabriela Silveira
Coordenadora do Departamento de Eventos